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Troço 7 | Salsas - Zoio
PERFIL
- Extensão: 34.28 km
- Altitude máxima: 1088m (Serra da Nogueira)
- Altitude mínima: 727m (Sortes)
Salsas é uma povoação pequena, onde ainda há poucos anos passava a linha de caminho de ferro do Sabor, cuja estação ainda se conserva, assim como a estrutura arruinada do edifício da Estalagem do Correio Real, mais conhecida como “Mala Posta”, local onde era feita, em tempos, a mudança das cavalgaduras.
Razoavelmente conservada, Salsas tem uma Igreja Matriz de origem românica, ainda com o pórtico principal de três arquivoltas de arco pleno e imposta chanfrada e um curiosíssimo padrão a S. Pedro, no centro da praça, frente à capela de S. Roque, constituído por um tabernáculo, como se fora umas alminhas e sustentado por um pedestal.
Saia para Vale de Nogueira, que fica a escassos dois quilómetros entre castanheiros e nogueiras (naturalmente, como o nome indica!) permitindo aqui um dos poucos acessos diretos à A4. Esta povoação chamou-se Ribeira de Lourenço até 1299, altura em que D. Dinis empraçou o reguengo (atribuiu-lhe praça e pelourinho, transformando terras reais em município) e determinou que se passaria a chamar Vale de Nogueira. Aí chegado desvie, por breves momentos, para conhecer o pelourinho de Vila Franca de Lampa ças, que não dista mais que dois quilómetros por boa estrada. É uma picota de fuste cilíndrico que atesta a memória do foral de 1286, que lhe substituiu o primitivo nome de Vilar de Bragadinha, que segundo a tradição terá sido despovoado numa desavença local em que os vizinhos engalfinhados se mataram uns aos outros, escapando apenas uma mulher.
Regressado a Vale de Nogueira, retome a Rota na estrada nacional, em direção a norte. Castanheiros e carvalhos abundam e o freixo, que tanto se viu ao longo do planalto mirandês, é ainda uma realidade, quer nas orlas ribeirinhas, quer em renques de delimitação fundiária, criando o afolhamento em bocage. E os característicos pombais em ferradura, agora também em menor profusão, continuam a marcar pontualmente a paisagem. A estrada serpenteia, paralela à via rápida, em direção a Bragança.
À esquerda, no cabeço de Santa Engrácia, pouco percetível da estrada, fica a ermida desta devoção e pouco adiante alcança Santa Comba de Rossas. À entrada da povoação uma indicação sinaliza Rebordaínhos à esquerda, a pouco mais de dois quilómetros por estrada regular. Esta aldeia, já foi vila, couto e sede de concelho até ao início do séc. XIX.
Acompanhada por castanheiros velhos e novos, isolados ou em soutos e por uma mancha contínua de cupressos, a estrada prossegue, serra acima, até à pequenina aldeia de montanha, anichada junto à ribeira de Vale de Moinhos. Já gozou de privilégio municipal como o ostenta o pelourinho de fuste octogonal, ainda com a argola da pescoceira, sobre um penedo granítico. Atrás, um fontanário de espaldar neoclássico compõe o enquadramento.
Regresse e desça a Santa Comba de Rossas. Vai passar no que resta da antiga estação da Linha do Tua, que foi nos tempos áureos do caminho de ferro a mais alta estação do país (altitude: 849 metros).
A povoação, que tem já razoável dimensão, é constituída por dois núcleos, um mais antigo, a norte, estruturado em torno da igreja paroquial e outro a sul, desenvolvido com a criação da linha do caminho de ferro do Tua, em 1905. O primeiro, que é o embrionar, conserva ainda alguns exemplares interessantes da arquitetura popular.
Está novamente numa zona onde as formações geológicas de base, de natureza xistosa, contrastam com as rochas eruptivas, circunstância expressa nas construções existentes, cujas alvenarias de xisto incorporam, para além dos tradicionais elementos de travação em madeira, elementos de granito que robustecem a estrutura. Continue para Rebordãos e console-se com a bonita vista que se desfruta à esquerda, sobre a serra de Nogueira. No entanto, se não for tarde, vale a pena perder algum tempo desviando, à saída de Santa Comba, para o Santuário de Nossa Senhora do Pereiro. Desça pelo estradão, sempre entre velhos castanheiros e lá chegará. É uma curiosa capela setecentista com galilé de três arcos, onde aflui muito povo em romaria no dia da Senhora a Grande, 15 de agosto.
Siga então em direção a Rebordãos e passe a ribeira numa alta ponte de arco redondo, da época do Fontismo – cronograma de 1867. A paisagem, marcada agora pelo carvalho negral, estende-se pelo planalto, com pastagens e matos rasteiros e a velha estrada nacional, em que segue, aproxima-se muito da autoestrada, correndo-lhe paralela em larga extensão. De súbito, a indicação à direita para Paçó coloca-o perante o monte de Pinela, coroado pelas ruínas de um velho castelo roqueiro. Neste entroncamento, à beira da estrada, verá um curioso abrigo paragem de transportes públicos, telhado e com lareira, uma pequena mordomia para agasalhar os passageiros dos rigores das invernias nas mais inóspitas situações das estradas transmontanas. Este é o primeiro que encontra mas outros verá quando subir à serra.
A estrada estende-se retilínea até à indicação de Sortes, uma povoação a poente, a dois quilómetros por caminho regular. Se lá for atente nos curiosos peitoris das janelas setecentistas, relevados como cornijas de papo de rola, comuns apenas a meia dúzia de lugares aqui em torno.
Voltando de Sortes à estrada nacional já se podem ver, à esquerda, sobre a serra de Nogueira, as antenas do centro de comunicações eriçadas junto ao Santuário da Senhora da Serra e à direita ainda o castelo de Pinela, restos de uma fortificação proto-histórica erguida no ápice de uma crista quartzítica que teve ocupação confirmada até à Idade Média.
Agora, nova indicação para a direita, desta vez para Mós, outro pequeno povoado, a pouca distância por extenso freixial e que conserva ainda a maior parte do seu primitivo edificado.
Por entre maciços de ailantos passa a ribeira de Remisquedo. As encostas estão agora cobertas por vinhedos, que aqui têm certamente condições favoráveis, a avaliar pela designação de “Vinha Velha” que se ouviu nas imediações de Mós. Quando alcançar um fontanário de desenho barroco estará à entrada de Rebordãos, povoação média, basicamente edificada em xisto e que já foi cabeça de importante concelho. Conserva ainda a velha picota, em rude fuste com escassos vestígios de um astrágalo a meia altura e rematado por um monólito com uma calote invertida no topo. Dos seus Paços do Concelho não há indícios, mas da prisão ficou ainda a memória na população local. Numa elevação a poente, a cerca de mil metros de altitude, mas cento e cinquenta acima da cota média da povoação são ainda bem visíveis os vestígios do castelo roqueiro de Rebordãos, que aqui lhe chamam também de Tourões, uma estrutura medieval desmantelada pelo tempo e pelas guerras. Sobranceiro à cidade de Bragança e gozando extenso panorama, facilmente se entende a importância que terá tido na teia defensiva da raia transmontana. E não muito longe, no Ferradal, abundam vestígios de um outro povoado, este muito mais antigo, que remonta, pelo menos, ao período da dominação romana.
Na descida para Rebordãos repare na variedade de culturas que preenchem o afolhamento dos vales e das encostas mais próximas. Trigais e centeeiras ceifadas e por ceifar, hortas e batatais, vinhedos, matos e pinhais, numa promíscua desordem típica da policultura das envolvências urbanas. Bragança de facto não fica longe.
Mosca, curioso topónimo. Enlaçando o alto do Lombo, aqui entronca a estrada onde se apoia a Rota. Seguindo em frente vai-se a Bragança, pouco mais de uma légua.
Não querendo ir a Bragança, prossiga a Rota, subindo a serra da Nogueira em direção ao Santuário da Senhora da Serra.
Se foi a Bragança, antes de retomar a Rota deverá fazer um pequeno desvio até Castro de Avelãs, visita indispensável, para poder conhecer o seu importante património. Aqui se conserva a cabeceira da igreja de um antigo mosteiro clunicense, com imponente ábside e dois absidíolos em alvenaria de tijolo com arcaturas cegas sobrepostas, possivelmente anterior ao século XII, extinto em 1543, quando era já da regra e posteriormente demolido. Filia-se na tradição românica mudéjar da meseta duriense castelhana, constituindo no nosso país exemplo raro, senão mesmo exemplar único. Aqui se hospedou em março de 1387 o Duque de Lancaster, John of Gaunt, com mil homens de armas que o acompanhavam, quando se encontrou com D. João I no planalto de Babe. Aqui poderá ainda observar o túmulo medieval de D. Nuno Martins de Chacim, o maior magnate da nobreza senhorial da segunda metade do séc. XIII, assim como vestígios de antigos espaços deste cenóbio. Todo este conjunto foi classificado como Monumento Nacional em 1910.
Em Castro de Avelãs foram encontradas algumas epígrafes, numa das quais é mencionado o povo zoela, colocando-se a hipótese de ter sido aqui a sua capital. Aqui passava também a designada Via XVII do itinerário de Antonino, testemunhada pelos miliários de Augusto (2 a.C.) e de Caracala (213 - 214). De Castro de Avelãs segue-se para a curiosa aldeia de Gostei, a 2,7km, que foi vila e sede de concelho, mantendo, na sua pequena praça, a igreja, o pelourinho e a Casa do Tribunal e Cadeia. Nesta aldeia existem ainda uma ponte e fonte de mergulho.
Deixando a praça com a igreja à esquerda, desça uma rua inclinada que liga à estrada principal e siga para poente contornando a albufeira até encontrar uma bifurcação para a direita que o leva à Capela da Senhora da Cabeça, que tira o nome do outeiro onde se eleva. É uma ermida de fachada cega, muito característica desta região, com duas festas anuais em que se leiloam oferendas de trigo e linho para o sustento da Confraria.
Depois de visitar a capela regressamos à estrada e viramos para a direita em direção a Nogueira. Aqui, visite a capela setecentista de S. Sebastião.
Continue pela N519 e tome à direita, a N206. A estrada percorre agora a serra a meia-encosta para poente. A paisagem é dominada quase exclusivamente pelo carvalho negral em extensos povoamentos estremes, que cobrem a serra, com raras clareiras de pastagem ou matos rasteiros. É esta a espécie que mais e melhor contribui para a variação cromática da paisagem ao longo do ano. Verde clara, matizada com o rebento das folhas em abril, vai escurecendo lentamente até setembro, quando a folhagem se torna rubra, permanecendo crestada e presa aos troncos até aos ventos fortes da invernia que despem e grisalham de líquenes a nudez do ritidoma. É com esta aparência, tão variável de estação para estação, que a serra de Nogueira se nos oferece, enquadrada na majestosa paisagem. É com este sentimento que desfrutamos a paisagem do Santuário da Senhora da Serra, no ponto mais alto, a 1320 metros. O templo aqui existente corresponde a uma reconstrução de um outro de época tardo-medieval, e está fortemente arreigada na devoção popular (Festa da Natividade da Virgem – 8 de setembro). Um complexo centro de telecomunicações garantiu, em tempos, a cobertura de uma boa parte da província transmontana. A esta nota pode ainda acrescentar-se que locais como este, com tão amplo domínio panorâmico, foram sempre privilegiados pelo homem, que aí foi deixando o seu testemunho. Não admira pois, que não muito longe da capela, na Fraga da Senhora, existam insculturas neolíticas com milhares de anos. Se tiver oportunidade não volte sem ver o interior da capela. Para além dos belíssimos retábulos barrocos, vale a pena apreciar a estrutura da cobertura e a sua sustentação.
Desça de novo a serra e retome a Rota. Vai encontrar a indicação de Carrazedo, que verá de longe envolvida num emaranhado de hortas e campos arroteados à floresta. Curiosamente, só nesta freguesia, estão identificados cinco povoados proto-históricos, alguns ainda com ocupação medieval, que aproveitaram o acentuado relevo morfológico, com diversos cabeços muito próximos entre si. Um deles é o castro de Terronha, muito próximo da aldeia de Carrazedo.
Com a baixada da serra a paisagem vai-se modificando de novo, pouco a pouco. As vistas continuam a merecer elogio, mas o coberto florestal torna-se menos denso, abrindo clareiras para secadais e pastagens com freixos nas áreas húmidas, reservando algumas cumeadas para matas de resinosas e dando lugar ao castanheiro, que começa de novo a impor-se em quantidade e em imponência. Não obstante, o carvalhal estende-se ainda, fazendo jus à opinião corrente de que se trata da maior mancha contínua da Europa de carvalhos “quercus pirenaica”.
Junto à capela de Santa Luzia há um desvio para Martim, Refoios, S. Cibrão e Celas e pouco adiante o cruzamento de Zoio, onde se conclui o sétimo troço da Rota.